terça-feira, 20 de dezembro de 2016

Sobre o conceito de igualdade, a diferença entre liberais e socialistas e os desafios contemporâneos



      Há uma ideia de igualdade que é muito importante para o pensamento liberal. Há uma ideia de igualdade que é muito importante para o pensamento socialista. Vale tentar entender a diferença.
O conceito liberal de igualdade tem origem na ética protestante e tem um forte elemento de imanência. Há aqui a ideia de que consciência tem autonomia sobre os fatores externos e que se o indivíduo puder escolher, ele (a) saberá o que é melhor para si. Ninguém pode escolher pelo outro e quanto mais livres forem os seres humanos melhor será a sociedade. Todos são iguais nesse sentido: cada indivíduo tem valor em si. Uma vida não vale mais do que a outra. A vida humana é sagrada. A liberdade é fundamental para que o ser humano tenha uma vida plena. A igualdade política (cada indivíduo um voto) e jurídica (todos iguais perante a lei) é básica para a vida em sociedade. Há aqui a ideia de que o poder emana dos cidadãos e de que o Estado precisa ser controlado para que não roube a liberdade dos indivíduos.  Qualquer um com poder demais tende a abusar dele. A liberdade, portanto, emerge onde o “poder pode ser picado em pedaços” . Soma-se a isso a ideia de que o ser humano é egoísta por natureza (expressa na Teoria dos Sentimentos Morais de Adam Smith, que é fundante para o liberalismo), e que isso precisa ser levado em conta na organização política da sociedade.
           O conceito de igualdade socialista é relativo à igualdade econômica e ao reconhecimento de que há injustiça na desigualdade. Uns nascem fortes, ricos e saudáveis. Outros nascem fracos, pobres e talvez até doentes. E essa injustiça deveria ser corrigida pela sociedade. Há a ideia de que o homem é bom por natureza, a sociedade que o corrompe (expressa nos Manuscritos Econômicos e Filosóficos de Marx), que recorre a complexa teoria da evolução dialética na história para explicar porque, embora o homem seja bom por natureza, a sociedade, que é um produto seu, o torna mau.
A oposição política se dá porque o conceito liberal de igualdade, nessa perspectiva, é acusado de injusto, porque os mais fortes e mais capazes acabam ficando com mais. Nesse sentido, seria importante um estado forte, com lideranças socialistas, para redistribuir as riquezas. Para os liberais, essa distribuição levaria a todos para a miséria e criaria oportunidades para oportunismos de toda natureza, o que, no fim, acabaria com qualquer motivação para trabalhar, jogando a todos na para uma situação pior.
Parte do debate se dá porque os liberais acreditam que se estamos em uma sociedade livre, onde não se pode prender (só o Estado pode, e no cumprimento da lei) ou escravizar o outro, os indivíduos podem procurar o que é melhor para eles e sair da situação de pobreza: podem empreender, por exemplo. Para os socialistas, a consciência é determinada pelas condições econômicas de produção (há um determinismo econômico) e há uma dependência dos mais pobres em relação aos detentores da propriedade. Marx usa o conceito de alienação e de ideologia para tentar explicar a questão da aceitação da ordem capitalista por parte dos trabalhadores (ou seja, eles aceitam trabalhar porque são alienados). Ou seja, há uma “falsa consciência” dos oprimidos. Daí a importância da liderança. E daí a relação entre socialismo e totalitarismo. O pobre não sabe o que é melhor para ele. Portanto, o conceito de igualdade dos socialistas não é ontológico. Há uns que são melhores do que os outros. Esses têm maiores responsabilidades e maior direito de buscar o poder político em nome dos alienados. Daí também a importância do discurso político da opressão. O partido ou a liderança irão salvar o oprimido “dos opressores”. Sendo o “opressor” um “sistema”, “uma maioria”, que se você não consegue enxergar é porque você é cego ou alienado. Se você não quiser sê-lo, precisa afirmar uma posição de salvação….
       O voto, para os liberais, precisa ser em um igual: outro ser humano com habilidades e competências limitadas, mas com um projeto de gestão pública claro, racional, transparente e que ajuste meios aos fins. Para os socialistas o voto é em uma liderança, capaz de nos salvar de nós mesmos.
                Esse debate reflete as discussões do século XIX sobre a natureza dos homens e as melhores formas de organizar a vida em sociedade. Há, no pensamento liberal do século XIX o pressuposto da independência. Há, no pensamento socialista, o pressuposto da dependência. Isso se traduziu, em termos acadêmicos, no individualismo metodológico da economia, por um lado, e no holismo metodológico de várias correntes da sociologia, por outro. O holismo, na sociologia, vem sendo criticado por vários sociólogos por eliminar o conceito de ação humana. O individualismo metodológico por eliminar os aspectos sociais do comportamento humano, inclusive a cultura, algo que os neoinstitucionalistas buscam resgatar, mas ainda derrapam nos desafios do individualismo metodológico.  

      É necessário progredir para um debate sobre a interdependência. A liberdade com responsabilidade de fato leva nessa direção. É necessário respeitar as liberdades individuais, senão a vida vira um inferno e a produtividade da economia desaparece. Mas é necessário fazer isso levando em conta que a racionalidade humana é fortemente impactada pelas formas de inserção social. Não é possível acreditar ou afirmar que a criança pobre que nasce na favela, não tem acesso à educação e é vulnerável ao crime está em condições de tomar decisões e fazer escolhas da mesma forma que aqueles que foram bem-educados para isso.  Tanto o egoísmo e quanto a solidariedade totalitária precisam ficar para trás. Precisamos pensar nas formas de subsidiariedade que de fato construirão uma sociedade mais livre e mais humana. Liberdade com co-responsabilidade é fundamental para um país com grandes desigualdades. E nesse contexto, a polaridade entre direita e esquerda só aumenta o ódio e a polarização estéril do debate politico. E isso ocorre por que a definição a priori de um conceito de homem funda uma ideologia. Ao fazê-lo, constrói muros. Que tal deixarmos esse debate com os mortos que os criaram e olhar para o futuro?
            O ser humano pode ser egoísta. Mas pode também ser altruísta. É aberto para bem, mas também pode ser aberto para o mal. Precisamos apoiar as pessoas na busca produtiva e evitar que os oportunistas se apoderem do trabalho alheio. Precisamos evitar a construção de um estado monstruoso onde a corrupção e o crime podem se instalar de forma tão robusta quanto a que vemos agora, dragando recursos do trabalho de todos. Mas precisamos, também, cuidar dos mais vulneráveis. O século XXI é o século do "E" - o século XIX foi o século do "OU". Não é uma coisa ou outra. É uma coisa e outra. E só a um jeito de fazer isso: com respeito pelas pessoas, por suas liberdades e estratégias claras e transparentes de subsidiariedade.
               Mas o curioso é como, embora se fale de inovação como valor, em termos de politica muitos preferem manter-se fiéis aos pensadores do passado.  A realidade mudou. A economia mudou. A sociedade e a politica também. O mundo ficou mais complexo. Mais integrado. A volatilidade e a incerteza aumentaram. Precisamos olhar para isso. Construir a partir disso. Precisamos pensar com novas ferramentas. Rever conceitos. Se olharmos para esses pensadores como iguais, pessoas como nós quebrando a cabeça para fazer sentido do que viam e viviam, podemos enxergar a quantidade de trabalho que há para fazer. Eles não poderiam antecipar o que estamos vivendo. Pensaram para a sua época. Mas curiosamente foram transformados em oráculos, em textos sagrados com verdades reveladas.... é curiosa essa resistência à mudança e as reações emocionais que geram.

sábado, 15 de outubro de 2016

Por que é tão difícil, para mim, escolher o candidato no segundo turno?

Algumas pessoas que votaram em mim no primeiro turno me consultam sobre o segundo. Perguntam a minha opinião. Mas eu não sei em quem votar. Mas falo agora como cidadã comum, não mais candidata, não mais disputando esse cargo.  Explico aqui a razão da minha dificuldade. Eu acredito que o objetivo maior da política é, e deve ser, a busca pelo bem comum. Quanto a isso, a maioria da população da nossa cidade concorda. O grande desafio é definir o que é o bem comum, o que é do melhor interesse da maioria e quais são as melhores formas de produzi-lo.
Podem haver tantas definições de bem comum quanto há habitantes em nossa cidade. Se os critérios de escolha forem baseados no egoísmo e mesquinharia, é impossível chegar a um consenso. Chegaremos, sim, àquilo que Hobbes chamou de a guerra de todos contra todos. E quanto mais mergulharmos nas vontades individuais em relação às formas de chegar até esse lugar desejado e abstrato, o lugar do bem comum, maiores tenderão a ser as discordâncias. Por isso a democracia é um exercício difícil, que demanda a construção de partidos, a organização de eleições e o engajamento em debates. A paz, a prosperidade, a vida e a liberdade dependem de acordos relativos à ética e lei. Como a felicidade e a satisfação de cada um são relativas às necessidades de cada indivíduo, aprendeu-se, ao longo dos últimos milênios de história, que há mais sofrimento humano onde não há liberdade para o indivíduo, pois o governante pode decidir por nós independente das nossas necessidades e vontades.
Ao longo da história o ser humano viveu sob a regra de diferentes tipos de tirania. Desde o começo da história e da escrita vemos o peso dos sistemas de poder oprimindo os povos. A opressão dos estrangeiros dominados nas guerras e usados na construção das pirâmides e palácios dos impérios teocráticos do oriente, o escravismo antigo na antiguidade clássica, a servidão medieval, a vida sob o absolutismo monárquico, e a violência das ditaturas na idade moderna e contemporânea são duros testemunhos do que o excesso de concentração de poder é capaz de produzir em termos de sofrimento humano.  A democracia tem defeitos. Mas nem de longe se assemelha a esses outros arranjos em termos de violência e sofrimento.
Uma das maiores dificuldades da democracia é produzir consenso sobre como atuar no maior interesse do maior número de pessoas. Como arranjo político, ela está baseada na ideia de que cada indivíduo deve falar por si e escolher o caminho de ação que mais representa os seus interesses. Mas sem a capacidade de formular juízos morais e ser responsável pelos destinos da cidade e dos outros, isso não funcionaria. Portanto, há outros entendimentos prévios que precisam ser levados em conta: desde a origem, a democracia baseia-se na premissa de que as pessoas que compõe a sociedade compartilham de um destino comum. De que elas estão ligadas, formam uma unidade, seja uma nação ou uma cidade, e de que todos se beneficiam da paz e da prosperidade que puder ser construída. Há uma outra ideia subjacente aos acordos democráticos: que em uma nação ou uma cidade as pessoas compartilham de certos valores e formam, por isso, uma unidade. A escolha deveria ser sobre os melhores caminhos para a paz e prosperidade partindo de um certo consenso sobre valores.
O exercício da democracia pressupõe, portanto, a liberdade com responsabilidade. E isso pressupõe a aceitação da ética e da lei mediando a relação entre os homens. A ética e a lei, por sua vez, pressupõe a capacidade de renúncia de cada indivíduo, da sua autodisciplina, da sua autonomia (auto + nomos = capacidade de dar a si mesmo a lei e norma). Como Kant, um dos grandes pensadores da ética colocou: é necessário agir de acordo com o imperativo categórico: aja de tal forma que sua ação possa servir de exemplo para todos, ser uma “máxima universal”. Para isso, é fundamental o exercício da razão e busca pelas virtudes. A relação entre esses termos é forte e direta. A democracia, portanto, está construída sobre um ideal de ser humano, capaz de cooperar para o bem coletivo a partir da sua capacidade de limitar seu próprio egoísmo, submetendo-se a lei e agindo de forma ética.
O conflito de interesses é da natureza da vida. Se cada indivíduo buscar sempre o maior prazer e o maior conforto sem levar o outro em conta, não há sociedade possível. Não é possível ser ético e buscar sempre defender o autointeresse. A democracia e a liberdade que ela garante dependem da busca por um ser humano melhor. Tenta-se construí-lo por meio da educação, da busca pela espiritualidade, pelo convencimento, pela dissuasão ou até mesmo pela força (no caso dos mecanismos de reforço das leis). Liberdade e razão são duas faces de uma mesma moeda e foram séculos de esforços na busca pelo aprimoramento institucional para chegar a esse arranjo.
 A liberdade e a razão dependem da busca pela verdade, esse ponto fugidio no horizonte que, por mais que tentemos nos aproximar, sempre nos escapa. Os filósofos concordam que, para os seres humanos, não é possível chegar à verdade, mas apenas às interpretações possíveis da realidade. Mas não podemos abrir mão do exercício de busca-la. Seja por meio da ciência, seja por meio da espiritualidade, seja por outro meio qualquer, pois essa busca é o que permite o desenvolvimento da pessoa, do ser humano, da sua capacidade de desvelar suas potencialidades, de descobrir formas de lidar com os riscos e desafios que a vida nos coloca.
Não podemos abrir mão da ética das virtudes tampouco. Pois é ela que nos ajuda a desenvolver a temperança, fundamental para pôr freio na nossa tendência aos exageros, nos gastos, nos prazeres... e a cultivar a paciência, tão necessária ao diálogo construtivo, a resiliência, tão importante para perseverar na dificílima busca por fazer diferença no mundo, a diligencia, pois é mais fácil perder para a preguiça, a bondade, pois é muito fácil julgar os outros, a caridade, que nos permite entender a dor do outro e cultivar a empatia, a humildade, que controla a nossa terrível vaidade, a castidade, que nos permite o difícil exercício da lealdade,  e tudo mais que nos permite ser livres, pois sem autocontrole somos escravos das nossas paixões, e os gregos antigos já alertavam para os riscos disso....
É no reconhecimento da existência desses desafios comuns, inelutáveis para todos os seres humanos, que nos permite pensar na igualdade: somos todos iguais, nessa terrível luta contra nós mesmos para sermos melhores. É esse reconhecimento também que nos faz valorizar a liberdade, pois não podemos nos desenvolver sem ela. E valorizar também a razão: pois é ela que nos ajuda na continua busca pela verdade e pelo conhecimento, que nos ajuda a relativizar nossos pontos de vista e nos obriga a aprender continuamente. E a compaixão, conosco e com os outros, pois somos seres de paixão e emoção e precisamos respeitar essa nossa natureza; há um equilíbrio tênue, difícil de encontrar, entre autocontrole, autoconhecimento, autocompaixão, autocomplacência, empatia, altruísmo e egoísmo.
Como a natureza humana é falha, a liberdade e a democracia pressupõe a constante vigilância. A vigilância, em termos de gestão pública, se dá pela boa governança, que são mecanismos de controle e transparência para garantir que o melhor interesse da maioria de fato é a bussola para a gestão pública. E isso pressupõe a busca pela verdade. Pressupõe clareza e pragmatismo, critérios objetivos de alocação de recursos, discutidos de forma aberta, com dados e fatos rastreáveis, com honestidade intelectual e verificação de validade das ideias e propostas.
E é por isso que não consigo escolher dessa vez. Quando vejo pessoas dizendo que devemos votar no Marcelo Crivella porque Deus quer, quando vemos a imbricação entre religião e política, voltamos à teocracia ou às teorias de direito divino dos governantes. Isso destrói a ideia de igualdade entre todos os seres humanos. Não de igualdade econômica. Mas de igualdade ontológica, essa igualdade relativa à nossa natureza, feitos de carne e osso e sujeitos às mesmas forças e fraquezas. E, portanto, da própria ideia de representatividade democrática, pois Deus escolheria uns e não outros para nos governar por critérios que nós não conseguimos conhecer. É o fim de liberdade de escolha. Se Deus escolhe por nós, logo não precisaremos mais de eleições. Quem somos nós, pobres mortais, diante desse apontamento divino? É o começo do fim do Estado Laico, e com ele do respeito à diversidade religiosa e das liberdades individuais, pois esse escolhido por Deus terá maior poder de definir a verdade que deve preponderar sobre as verdades de todos os demais. Isso me afasta do Crivella.
Mas também não consigo me aproximar do Freixo. Quando ouço a sua campanha vejo a produção do discurso em defesa das minorias como se de fato houvesse um sistema, ou uma maioria, que as perseguisse. Vejo a manipulação discursiva dos fatos para produzir adesão emocional a causas que, se olhadas de perto, de fato destroem a própria noção de bem comum e encaminha para a guerra de todos contra todos. Seus eleitores, principalmente os mais jovens, são engajados na sua campanha por que discordam da homofobia, da violência contra as mulheres, da morte dos jovens negros, da discriminação em geral. Mas a maioria da sociedade também discorda!!!! É difícil localizar essa maioria contra a qual estão lutando!
A nossa sociedade sempre foi aberta e tolerante. Existem criminosos. Existem os homofóbicos, existem a violência contra as mulheres e existe a maior mortalidade dos jovens negros. Mas há leis contra isso. A maioria da sociedade é não é favor disso e as leis são a prova dessa adesão.  Não temos cultura de estupro, não temos cultura homófobica, não temos grupos de criminosos brancos, índios ou amarelos que saem para matar negros.  Temos dificuldade de investigar, educar e punir aqueles que descumprem as leis. Temos dificuldades de apoiar os mais vulneráveis para romper o círculo vicioso da pobreza e da violência. Temos dificuldades gerenciais. Mas concordamos sobre a maioria dos problemas. Então por que dividir? Por que criar a sensação de perseguição e ódio?
Freixo, como historiador, sabe que o sentimento de pertencimento à uma nação vem enfraquecendo e que a modernidade produziu a fragmentação das identidades e a abalou os quadros de referência. Stuart Hall, dentre outros, vem estudando esse efeito. Conforme ele, as paisagens culturais de classe, gênero, sexualidade, etnia, raça e nacionalidade não mais fornecem "sólidas localizações" para os indivíduos. O que existe agora é descentramento, deslocamentos e ausência de referentes fixos ou sólidos para as identidades. Nesse cenário, a identificação surge por empatia com o sofrimento do outro. Há o crescimento da emotividade e do subjetivismo. E a campanha do Freixo cresce sobre esses dois pilares. O sofrimento subjetivo (todo o sofrimento de fato é subjetivo, as me refiro a esse de “como eu me sinto quando alguém me diz algo que me causa uma sensação ruim) ganha a mesma relevância do sofrimento causado pela miséria, pela doença e pelo abandono. A causa das minorias se dá contra inimigos genéricos e imaginários e perde de vista a situação de vulnerabilidade de grupos sociais que deveriam ser o foco mais direto das políticas públicas, e aqui me refiro especialmente à fragilidade das mães negras e pardas nas nossas favelas e outros grupos vulneráveis.
 Olhando para o discurso do Freixo, cheio de desejos de estatização e foco no papel do estado, é impossível não ver que a criação de uma empresa estatal de transporte público roubará recursos para resgatar essas mulheres da miséria para dar transporte subsidiado para jovens universitários que em relação a elas formam uma elite. É o socialismo às avessas. É a dispersão de recursos públicos sem um plano de ação coerente com capacidade de promover o bem comum. Com a imensa carga tributária que hoje incide sobre o consumo, quem mais paga imposto são os mais pobres, que precisam usar toda a sua renda para consumir. Serão os mais pobres a pagar pela dispersão dos recursos e pela criação de empresas estatais. Nossos jovens socialistas votam a favor do aumento dos impostos sobre os mais pobres, pois é daí que virão os recursos para tudo o que o Freixo propõe! Não há como vir de outro lugar. É o socialismo que tira dos pobres. Nossos jovens votam sem entender o fluxo de recursos na sociedade, sempre da sociedade civil e dos indivíduos para o Estado! E sem entender o impacto da dissipação dos recursos públicos sobre o aumento da pobreza! Andaram matando muita aula, não leram os textos certos ou simplesmente não pararam para entender como as coisas funcionam na prática, nesse tecido duro da vida que insiste em resistir aos nossos malabarismos linguísticos e as nossas noções de justiça abstratas, construída sobre conceitos que distorcem a realidade, mais do que a iluminam!
Todos os estudos do Banco Mundial (ver Global Gender Gap Report, disponível na web em PDF) e da ONU (ver metas do milênio) confirmam que já uma relação entre miséria crônica e gênero. A enorme maioria (mais de 80%, chegando a 90% dependendo da região) dos miseráveis do mundo são mulheres e crianças até 10 anos dependentes dela. A causa, é a maternidade. O abandono das mães pelos homens (na nossa cidade, cerca de 48% dos domicílios são sustentados por mulheres) gera a terrível situação de vulnerabilidade desses indivíduos. Para sair para trabalhar, a mãe deixa as crianças vulneráveis. Se não sair para trabalhar, ficam miseráveis. Esses jovens, vítimas de múltiplas formas de violência, física, sexual e/ou psicológica e abandono, são facilmente recrutados pelo tráfico e outros tipos de crimes. São eles que matam. E são eles que morrem. Nossa polícia pode ser melhorada. Mas não é ela a única ou a principal causa da enorme mortalidade de jovens negros. É o crime. E a saída é o foco nas mães e na proteção dessas crianças, com creches horário integral ou até 24 horas, para as mulheres que trabalham à noite. Como essas mães tem dificuldade de permanecer no mercado de trabalho, criar essas creches gerando emprego ou oportunidade de empreendedorismo para elas seria a política pública que mais resultados teria na construção da paz e da prosperidade na nossa cidade, pois atuaria preventivamente sobre o crime e proativamente na redução da miséria.  Os recursos são poucos. Foco é fundamental.
Mas ao invés de fazer isso, Freixo cria inúmeros inimigos imaginários e cria um programa de governo que promete dissipar recursos em diferentes áreas e iniciativas de forma errática cujo resultado obvio será a perpetuação da miséria e do crime e a falência da prefeitura.  E aprova esse projeto junto a esses públicos engajado pela emoção e pela empatia produzido por um discurso de ódio de todos contra todos. Se ganhar, e conseguir colocar o que promete em prática, essa mãe provavelmente pagará mais do que os 50% que já paga de imposto sobre a energia elétrica, 18% do feijão dos seus filhinhos, dará mais do que um iogurte para o governo a cada dois que coloca na mesa das crianças. Não está claro para esses jovens que o programa de governo do Freixo só é possível a esse custo. E isso é, no mínimo, muito, mas muito injusto mesmo.
Em ambos os casos é o fim da razão, o fim da racionalidade no uso de recursos escassos e o fim de um projeto de sociedade democrática construído sobre a ética e a potência humana. Infelizmente não há menos pior. Pois ambos diminuem o ser humano, diminuem o cidadão, na sua capacidade, na sua liberdade de escolha, na sua autonomia, como caminho para um projeto de poder.
A razão, a consciência e a ética não são o caminho mais duro. São o único caminho. Não há solução mágica. Não há ser humano capaz de eliminar todos os sofrimentos dos outros. A vida humana, o indivíduo, continua com seus riscos, com suas batalhas, com suas derrotas e com suas vitorias. A política feita a despeito da liberdade e da razão ameaçam séculos de esforços civilizatórios. Produz mais pobreza e mais sofrimento. Não há bons resultados possíveis se escolhermos qualquer uma dessas rotas. E é muito difícil antecipar os todos os resultados ruins que podem gerar. Por isso não consigo decidir.


sexta-feira, 22 de julho de 2016

Ética e a cidadania

Ética e a cidadania

                Há  um conceito básico de ética nos textos de um dos maiores filósofos que a pensaram: é o imperativo categórico, de Kant. Segundo ele, é dever de todo ser humano agir conforme os princípios que gostaria de ver na ação de todos os outros. É ético o indivíduo que age de forma que a sua ação possa ser uma máxima universal.
                No entanto, na pratica, a vida é permeada por desafios de natureza prático-moral, em que não é possível ter 100% de razão em nenhuma linha de ação. O conflito de interesses é da natureza da vida. Por exemplo, se quisermos ser 100% a favor da preservação ambiental, no limite não podemos nem mais ter filhos, pois isso vai impactar no consumo e na produção de esgoto e lixo. Ser ético não pode ser não ter mais filhos, pois isso significaria o fim da vida humana. Ser ético é compreender o impacto que causa e tentar reduzir os danos. Portanto, ter filhos, reciclar o lixo, apagar as luzes sempre que puder, comprar carros menos poluentes, apoiar empresas éticas, que usam produtos menos tóxicos, etc. Se todos agissem dessa forma, não seriam necessários controles.
                A liberdade com responsabilidade pressupõe a capacidade de se impor sacrifícios. Se em nome de um bem maior ou do direito do outro não me imponho sacrifícios, simplesmente não sou ética. Sou só egoísta. A ética, portanto, pressupõe a busca pelo cultivo das virtudes.
                 A ética, como filosofia racional, na prática dialoga sempre com a cultura. E a nossa cultura nacional é fortemente aberta a auto complacência, a auto indulgencia, ao fatalismo (sempre foi assim! A saída para o Brasil é o aeroporto!) e a volatilidade emocional.  A liberdade humana, de acordo com essa corrente de pensamento, aumenta com o autocontrole, com a autodisciplina, com a consciência crítica, com a busca pela razão. A liberdade defendida pela Escola Austríaca é um exercício olímpico nesse sentido! 
                O desafio de aumentar a liberdade não é fácil por essa razão. O Novo tem um desafio gigantesco em relação a conscientizar os indivíduos sobre a sua responsabilidade e torna-los sócios no nosso projeto (ver: www.novo.org.br). Isso é fundamental para termos sucesso em outro desafio: motivar o cidadão a atuar na política com visão de longo prazo!
                Isso é precondição para termos sucesso no aumento das liberdades (politica, jurídica e econômica) e atingir nosso objetivo de reduzir o papel do Estado para aumentar a prosperidade criando um contexto capacitante para a inovação e o empreendedorismo.

                A virada de uma sociedade com uma visão mais coletivista, que olha para o indivíduo como um incapaz que precisa ser tutelado pelo Estado, para uma mais individualista, que olha para o indivíduo como o único ente que de fato produz valor, na verdade coloca um desafio para cada cidadão.  Precisamos que cada um seja mais forte, acredite mais em si e seja mais responsável por suas escolhas. Teremos esse desafio na campanha. Precisamos de cada indivíduo que acredita nisso trabalhando para conscientizar, atrair e engajar outros cidadãos no nosso projeto! Juntos seremos muito mais fortes. Juntos somos NOVO!
Sobre a informação, a desinformação e os riscos para a democracia

                Na teoria, a democracia é um conjunto de regras que garante que a gestão pública é feita de acordo com a vontade da maioria. É um mecanismo de fragmentação do poder (nas três esferas: legislativo, executivo e judiciário) que garante os direitos dos indivíduos frente à concentração de poder necessária ao funcionamento do Estado e a garantia da liberdade. É contra intuitivo achar que a liberdade se relaciona positivamente com o Estado. Mas basta lembrar da sociedade medieval, antes da unificação dos territórios em Estados nacionais: havia o monopólio da força pelos senhores feudais mais fortes e todos viviam sob domínio das suas regras. Não havia mecanismos de garantia de contratos, não havia justiça e não havia polícia para a qual ligar se alguém entrasse violentamente na sua casa e impusesse a sua vontade por meio da força.  O filme de Mel Gibson, Coração Valente, é um bom exemplo do que é isso. O filme “O Nome da Rosa”, baseado no romance de Umberto Eco, também, pois mostra o que acontece quando uma instituição (a igreja daquele tempo) dá as regras sobre o que pode ser lido, dito ou pensado. Foram séculos de evolução até chegar em um arranjo em que os direitos dos indivíduos pudessem estar garantidos. A concentração do direito ao uso da força pelo Estado e a regulação do seu uso por meio da lei discutida democraticamente foi o que acabou com esses abusos. A liberdade de ir e vir, especialmente das mulheres, fisicamente mais fracas, dependeu de um arcabouço legal capaz de condenar à prisão quem, no uso da sua liberdade e dos seus direitos, viola a liberdade e o direito dos outros.
                A defesa dessa liberdade dos indivíduos: contra a opressão direta por outro ser humano e a liberdade de escolha (entre permanecer ou não em uma relação contratual e liberdade de empreender) gerou um enriquecimento sem precedentes nas sociedades que conseguiram se organizar para garanti-la. Há aqui uma questão chave para nós, hoje, no Brasil: garantir que o Estado seja essa organização criada pela sociedade para garantir direitos, contratos e a liberdade. Um Estado capaz de garantir o direito à vida (ninguém pode matar ninguém por força da sua vontade), o direito à liberdade (só o Estado pode condenar, punir e emprisionar) e o direito à propriedade é fundamental para a produção de riquezas e a viabilização da justiça. O contrário disso seria a guerra de todos contra todos, em que indivíduos gastam suas vidas lutando para não ser atacado naquilo que em sociedade chamamos de direitos fundamentais, ou a perda da liberdade causado por uma organização estatal que não garante a liberdade e os direitos, mas usa a concentração de poder para impor sobre a sociedade um projeto que não representa o melhor interesse da maioria.  De modo geral as pessoas concordam com essa ideia de liberdade e de que o Estado deveria garanti-la…. A não ser quando aqueles que são contrários a ela embaralham a comunicação….
                Durante os últimos anos vivemos sob o governo de um partido que, no discurso público defendia aquilo que acreditava que a população queria ouvir, mas pelas costas da sociedade criava um projeto de aumento do seu poder para implantar um regime que, se explicitassem, se falassem as claras, se botassem em discussão, a sociedade não aprovaria. As campanhas foram montadas sobre mentiras. As estratégias das agências de publicidade que desenvolveram o marketing político no Brasil estão baseadas não apenas em argumentos falsos, mas em estratagemas e planos táticos desenvolvidos para gerar confusão e desinformação. Mente-se, não apenas por falta de caráter, mas como parte de um projeto de poder. Enrola-se a comunicação para que a maioria não consiga, no caos de argumentos desconexos, articular um discurso de orientação por valores que seja a síntese daquilo que deseja ver na prática política. No meio do caos, os indivíduos se sentem incapazes de saber quem é bom e quem é ruim, o que é possível e o que não é, e acabam por ser levados por simpatias ou pela emoção.  Esse é o começo do fim da democracia e de séculos de esforços por garantir que as liberdades individuais e a racionalidade na escolha prevalecessem no cenário político. As campanhas baseadas em simpatias e emoção só beneficiam aqueles que, se apertados no terreno duro da racionalidade e possibilidades concretas, perdem espaço para suas agendas ocultas e seus acordos mirabolantes.
                É por isso que mantemos a ancora no pragmatismo, na orientação por valores e no discurso simples de quem lida com dados, fatos, possibilidades e restrições reais. Contra todas as formas de engano, confusão e conflito, que são estratégias de poder que destroem os direitos individuais e as liberdades, voltamos sempre aos dados, fatos e valores. Essa é a estratégia de resistência necessária aos cidadãos comuns que dizem não às formas espúrias de fazer política.  Não nos interessa ganhar com mentiras. Não nos interessa a confusão. Não nos interessa uma campanha em que oponentes pegam frases soltas, fragmentos de informação, e nos atacam. Essa é a forma de fazer política dos desonestos e das suas vítimas, aqueles que, sem domínio das próprias emoções, saem atirando argumentos como loucos no meio dos debates sem sentido buscando desesperadamente acreditar que com isso conseguem fazer a diferença no meio da gritaria. Estamos do lado dos que fazem o duro exercício da ética e da razão. Serão necessários: resiliência, autocontrole, foco e paciência na dura tarefa de fazer uma campanha limpa. Vão nos atacar de todas as formas. Essa é a tática dos nossos oponentes. Nos manteremos firmes na busca por valores e na racionalidade ancorada em dados, fatos, possibilidades e restrições.  Como cidadãos na política prometemos lutar contra o caos produzido pelas táticas de desinformação, rotulação, acusações soltas e decisões precipitadas e parciais. Faremos isso porque temos certeza de que essa é a única forma de representar cidadãos como nós, comprometidos com a qualidade da escolha na política, com representatividade democrática, com a concretude das promessas, dentro de uma sociedade de indivíduos capazes de exercer a liberdade com responsabilidade.


Sobre a proximidade, representatividade, diálogo e a justiça

                Ontem uma equipe do Novo foi à Vargem Grande, convidados pelo Sardinha, nosso pré-candidato a vereador, para conversar com a Associação de Moradores. Havia um incômodo com o PEU das Varges, um projeto criado pela prefeitura em associação com a Odebrecht e a Queiroz Galvão em uma parceria público-privada para a urbanização da região. Lemos sobre o projeto, vimos as reportagens sobre o tema, lemos os projetos de lei envolvidos em sua regularização para irmos preparados para a conversa. O projeto parecia muito bom. Restava a dúvida: por que os moradores estavam incomodados com ele? Seria algum tipo de resistência à mudança? Deveríamos, se ganharmos, dar continuidade a ele?
                Para nossa surpresa, a grande questão dos moradores não é com o projeto.... Até acham interessante.... é com o fato, bastante absurdo, da prefeitura não ter discutido o projeto com os moradores como prevê a lei e não ter preparado a região para ganhar com ele. Ouvimos, negativamente surpresos, que até hoje as diferentes administrações municipais não regularizaram a ocupação do solo e não organizaram o mínimo necessário para dar segurança jurídica aos moradores. Não fizeram o básico para que as pessoas possam regularizar a situação das suas propriedades.  Falando assim pode-se pensar que estamos falando de invasões.... Não é o caso.... Pouca gente hoje sabe que os cartórios no Brasil são da década de 1920 e que os registros de propriedade, no passado, ou eram garantidos pelos usos e costumes, por documentos de concessão estatal (como no caso das capitanias hereditárias), haviam registros em igrejas ou eram conquistados na bala.  Há ainda hoje no interior do Brasil inúmeras disputas relativas aos direitos de propriedade sobre a terra. Ora, sem direito de propriedade não há economia de mercado que funcione, há forte instabilidade jurídica e uma grande fragilidade do cidadão para garantir o seu direito.
                Em Vargem Grande e Vargem Pequena alguns proprietários rurais fracionaram e venderam pedaços das suas propriedades e nunca conseguiram legalizar por falta de ordenamento da região, que é atribuição da prefeitura. A região foi se urbanizando por fragmentação, como ocorreu na origem de todas as cidades do mundo, sem que as administrações municipais se dignassem a ir lá para ordenar. A Associação de Moradores afirma que os pedidos de ordenamento urbano da região são tão antigos que não há memória de quando as solicitações começaram. Talvez 100 anos…. É impressionante como o discurso de modernização convive com omissões dessa ordem.  A função do Estado na garantia dos contratos e do direito de propriedade é estrutural para todos os outros acordos entre os indivíduos.  Imaginar que omissões dessa ordem existam dentro da região metropolitana do Rio de Janeiro no século XXI é de estarrecer…. O que os moradores querem é que a prefeitura faça a sua parte na emissão dos documentos necessários para que eles possam fazer as escrituras das suas propriedades e tenham certeza de que os projetos mirabolantes não passarão com tratores sobre suas casas sem que tenham recursos para se defender.... É, no mínimo, justo!  Feito isso, sentam-se na mesa para discutir qualquer proposta para a região.  Sem segurança jurídica e garantia dos direitos de propriedade não há economia de mercado!  


sexta-feira, 24 de junho de 2016


A dicotomia entre direita e esquerda está ultrapassada. É necessário abrir espaço para o Novo....

 

Nunca foi tão verdade que o indivíduo é o único gerador de riquezas, o livre mercado é fundamental para a dinâmica da inovação e da produção de valor e o agente de mudanças. E de que precisamos ser responsáveis por nossas ações e nossas escolhas.

O controle centralizado é absolutamente incapaz de produzir resultados em um mundo complexo e imprevisível, com uma enorme incerteza, um grande número de inovações disruptivas e várias formas possíveis de escolher viver a própria vida.

                Uma das perguntas que mais ouço ultimamente é se sou de direita. Quando digo não necessariamente, perguntam se sou então de esquerda. Digo que nem um nem outro. Me perguntam então se sou de centro. Ora! Também não. As formas de pensar a política nos séculos XVIII e XIX simplesmente não são adequadas ao século XXI.  Elas simplesmente não funcionam para a sociedade do conhecimento, da inovação, da integração em redes, das dinâmicas colaborativas.

 
                Explico as razões abaixo:

 
Há dois pensamentos estruturantes da noção de direita e da esquerda: a ideia de que a direita é a favor do capital e a esquerda a favor do trabalho. A direita é a favor dos ricos e a esquerda a favor dos pobres. Logo: A ideia de que a defesa dos interesses dos trabalhadores onera as empresas e que as empresas têm interesse em explorar os trabalhadores. Há a ideia de que a direita defende o egoísmo individualista e a esquerda a solidariedade altruísta. Há a ideia de que liberdade é uma agenda de direita (exceto pelo anarquismo e anarcossindicalismo) e o Estado forte é do interesse dos pobres. Há, também, a ideia, e essa acho particularmente absurda nos dias de hoje, de que as elites têm interesse na pobreza e dela se beneficia.

 

Ora:

A noção da esquerda de que o capital (e o capitalismo como sistema derivado da acumulação desse) tem interesses opostos ao trabalho está baseada na ideia desenvolvida por Marx de que a propriedade dos meios e instrumentos de produção permite aos capitalistas extraírem mais-valia do trabalho, dado que o trabalhador só teria a força dos braços para vender e precisaria do capital para trabalhar. Essa noção perde a relevância quando a economia passa a ser cada vez mais conhecimento-intensiva e o conhecimento, que se torna o principal ativo dessa economia, pertence ao trabalhador. Vimos pessoas como Bill Gates e Steve Jobs criarem empresas gigantescas com as inovações que conseguiram pensar. A barreira do capital praticamente desparece na sociedade orientada pela inovação.

Empresas que constroem sua atuação baseada em trabalho mal remunerado são pouco competitivas e tendem a não resistir à competitividade do mercado atual. Uma economia fortemente construída sobre essas bases é extremamente frágil. Essas são, cada vez mais, uma realidade nos mercados fechados, protegidos por um Estado que promove a sobrevivência dos menos eficientes, onde há mais corrupção e mais oportunismos.

Na ausência de uma educação mais estruturante da dinâmica do conhecimento o pobre fica pobre não porque isso é bom para a elite, mas porque fica excluído da economia. Não há quem ganhe com isso em uma econômica competitiva. Pelo contrário: a pobreza e a exclusão favorecem ao crime, à violência e a desorganização das cidades. E isso é ruim para todo mundo.

Mais qualidade de educação, pelo contrário, é bom para as empresas e para todos os indivíduos. Nos países com mais liberdade e qualidade de educação, a pobreza foi praticamente eliminada.

Pensar em termos de direita e esquerda é pensar em termos de jogos ganha-perde. Para alguém ganhar, o outro tem que perder. Na sociedade do conhecimento e da inovação, quanto mais indivíduos capazes tivermos, mais todos ganham. É uma outra mentalidade, uma nova forma de olhar para a vida em sociedade e para a economia. Sem liberdade, os indivíduos simplesmente não conseguem fazer bem o que precisam para ser produtivos e colaborativos, ao mesmo tempo, sociedades intensivas em conhecimento funcionam assim, de forma interdependente.

 

 

 

 

 

 

 

 

 
Sobre a igualdade, a liberdade e a meritocracia como fatores de desenvolvimento

                Eu fui convidada para falar para um grupo de jovens e crianças na Igreja da Ressureição, em Copacabana. A maioria delas da comunidade do Pavão Pavãozinho.  Perguntei: vocês são livres? Todos concordaram que não. A razão pela qual acreditavam não ser livres era porque não podiam ter e fazer tudo o que queriam. Não era esse o entendimento de liberdade que me interessava. Porque não é possível para o ser humano esse tipo de liberdade. Eu gostaria de voar. Sonho antigo da humanidade. Mas não posso. Isso não reduz a minha liberdade.
 Mudei a estratégia. Falei sobre vários líderes empresariais brasileiros que quando começaram a sua história eram tão pobres quanto eles. Não é difícil achar. Esses são muitos em um país de imigração e industrialização recentes. Perguntei: o que vocês acham que eles fizeram para conseguir tanto sucesso? Eles responderam: deram sorte, roubaram ou enganaram alguém ou alguém ajudou; Eu estava tentando demonstrar que é possível mudar a própria vida se a pessoa se organiza para isso e persevera nas suas intenções.... Estava difícil.
Tive uma ideia: recorri à antiga metáfora do anjinho falando em um ouvido e o diabinho falando no outro. Perguntei: o que o anjinho fala em uma orelha? Um menininho de uns 9 anos disse: ele diz para eu tomar banho.
- Você toma?
- Não....
- O que o diabinho diz?
- Ninguém vai me cheirar mesmo....
- Mas quem quer seu bem?
- O anjinho.... Se eu não tomo banho fico cheio de pereba..... Mas eu não gosto muito de banho......
Quem mais quer contar uma história? Outro menino, agora com uns 14 anos, começa:
- O anjinho diz para eu ler e estudar.
- Você lê e estuda?
- Não.
- Mas porquê? O que o diabinho diz?
- Não é diabinho não.... é um diabão desse tamanhão.... É meu game.... vou estudar ele diz: você está quase passando da fase..... Meu pai grita: menino, desliga esse negócio e vai estudar..... o diabão diz: nem liga.... daqui a pouco ele tá babando no sofá.....

Falamos sobre a liberdade como a capacidade humana de escolher entre coisas melhores e piores…. Eles acharam esse exercício muito difícil. Não estão sozinhos. O peso da liberdade é mesmo difícil de carregar…. Ser livre é ser dono das próprias escolhas e responsável pelas consequências…daí a sua importância. Essa era a razão pela qual estávamos ali. Em um grupo chamado, não sem razão, grupo da Perseverança. O objetivo é apoiar-nos uns aos outros nessa difícil tarefa. Pois embora difícil, tentar escapar dela é sempre pior....

Mudamos o exercício. Propus um teatro. Contei essa estória:
-  Eu sou um trabalhador ali da comunidade. Trabalhei minha vida toda e agora perdi o emprego. Recebi meu fundo de garantia e tinha algum dinheiro na poupança. Pensei: o que posso fazer? Pensei nas crianças da comunidade, em como era difícil descer para tudo, até para comprar um lápis. Decidi abrir uma pequena papelaria na varanda da minha casa. Trabalhei duro. Com o dinheiro que ganhava sustentava minha família. Aos poucos minha papelaria ficava conhecida e eu vendia mais. Procurava ter o melhor preço possível. As crianças não tinham muito. Ganhava meu dinheirinho, mas era sempre pouco e apertado. Mas como eu sabia o que elas precisavam e tinha um preço bom, comecei a prosperar. Nessa hora decidi colocar uma placa na porta: “Precisa-se de ajudante”. Disse para eles:
- Vocês precisam vir para a entrevista de emprego e me convencer a contrata-los.
O primeiro disse:
- Moço, sei que o senhor está procurando ajudante.... Que preciso de emprego. Minha mãe está doente, os remédios são caros... eu disse não.
O segundo disse:
- Eu tenho cinco filhos... minha mulher está gravida do sexto.... Não tenho como comprar comida. O senhor me dá esse emprego?
Eu disse não, infelizmente eu não poderia dar o emprego para ele.
O terceiro contou uma história pior, de doença e fome....
Eu disse não.
Então o menino disse: mas a senhora é ruim que é o cão, hein? O que eu preciso dizer para a senhora me dar o emprego?
- Que você é muito bom de matemática, pode me ajudar muito a melhorar o meu negócio. Seria melhor se você disse: - gostaria muito de trabalhar aqui. Sou muito bom de vendas. Tenho uma serie de ideias de como podemos crescer. Se eu conseguir fazer o seu negócio crescer, digamos, 50%, o senhor me dá uma sociedade?
Os meninos disseram: - Não, isso não pode dizer! O dono vai achar que você quer tirar vantagem dele!!!!
De onde veio essa crença? De que ser necessitado, dependente e sem ambições seria melhor do que ser capaz, altivo e propositivo? O que essa crença tem a ver com a falta de valor que o jovem dá para escola?
Ela vem de uma profunda visão de desigualdade e de que o interesse do pequeno empresário é diferente e oposto ao do seu funcionário. Essa crença está por trás da ideia de que trabalhar para ajudar o patrão a prosperar é uma forma de aceitar a própria exploração. É a visão de que numa sociedade de desiguais, em que para um ganhar outro tem que perder.
O pequeno empresário, se tivesse gasto seu dinheiro ao invés de investir, por medo do risco de fazê-lo, seria um igual. A coragem de correr riscos, trabalhar duro e tentar vencer parece colocá-lo em um outro lugar: no lugar dos fortes e poderosos que, por falta de escrúpulos, emprega alguém para enriquecer às suas custas. Ao não se ver como igual, o jovem não vê valor em unir forças e aproveitar que o outro acumulou algum dinheiro para partir de uma posição de maior vantagem em seu próprio esforço por empreender para construir algo melhor.
                A visão de igualdade o ajudaria a perceber que se o outro está buscando ajuda é porque há mais trabalho do que ele consegue fazer sozinho. De que para um pequeno empresário como esse em uma comunidade, não deve ser fácil sustentar a família e pagar as contas. E que mérito está em ajudar o outro a ganhar ajudando-o a gerar mais valor para as pessoas que são clientes do seu negócio, nesse caso as crianças da comunidade. E que o estudo ajuda nesse esforço de prosperidade. Que liberdade, nesse caso, é a capacidade de enxergar alternativas e fazer as melhores escolhas para si mesmo, pois a soma das melhores escolhas individuais produz resultados melhores para todos, colabora para que juntos todos se beneficiem do esforço de cada um.
                A visão de desigualdade faz com que o jovem ache que emprego é caridade. Que o empregador, já sobrecarregado com a tarefa de cuidar da própria família e do próprio negócio deveria dar emprego para alguém que colocaria mais peso sobre os seus ombros. Nesse contexto ele não consegue enxergar o valor da sua contribuição. E não consegue fazer as melhores escolhas. Ele não entende o que queremos dizer quando afirmamos que o indivíduo é o único gerador de riquezas. Que o livre mercado é a maneira mais fácil de fazê-lo prosperar. E de que todos se beneficiam quando ele usa o máximo das suas competências. Temos muito trabalho a fazer. Precisamos da sua inteligência e da sua vontade para estarmos melhor no futuro. E ele não sabe do valor que tem.
                Igualdade, liberdade e meritocracia pressupõe o esforço da subsidiariedade. Dessa capacidade de ajudar o outro a desvelar todo o seu potencial. Essa é a solidariedade que nos fará melhores. Se todos tentarem, será muito mais fácil cuidar de quem precisa. Eles serão em muito menor número e o conjunto dos cidadãos será muito mais prospero.