A sustentabilidade ambiental e a participação
feminina no mercado de trabalho: desafios para a prosperidade, competitividade
e redução de riscos:
A questão da sustentabilidade ambiental e do
suporte às mulheres no mercado de trabalho causaram um debate quente, por vezes
com muita agressividade e acusações vagas e confusas sobre a minha possível orientação
politica. Me chamaram de social-democrata como se isso fosse ofensa, de esquerdista,
além de termos de baixo calão – que apaguei do meu facebook porque ninguém
merece!
Se há
uma coisa que respeito, é a diferença de opiniões. Ela é boa na politica. Mas as
manifestações agressivas e acusatórias naturalmente escondem outro fenômeno: a
desorientação em um mundo complexo, volátil, incerto e ambíguo, por um lado, e
o medo que certos “intelectuais” vem propagando, de forma irresponsável, do meu
ponto de vista, sobre temas que assombram, sem razão, os eleitores.
Acho que entender a gênese de certas ideias e
sua evolução no tempo é bom para formarmos uma opinião. Vou contar o que vi sobre a evolução da
questão da sustentabilidade, outro lado da moeda da ideia de responsabilidade
social corporativa.
Eu fui para o Japão em 1985. Era um outro
mundo. E outras questões. Fiquei lá por 13 anos, período no qual tive a
oportunidade de trabalhar como assessora para assuntos de ciência e tecnologia
da embaixada do Brasil em Tóquio. Não
era um “emprego formal”. Era um contrato que a Embaixada fazia com alunos de
doutorado para acompanhar os fóruns sobre ciência e tecnologia no Japão e fazer
relatórios para facilitar a cooperação internacional nos temas relevantes.
Acompanhei de perto parte dos debates que
aconteceram em Kyoto em 1997. A Wikipedia explica o que foi isso: https://pt.wikipedia.org/wiki/Protocolo_de_Quioto.
Pude acompanhar Brasileiros por lá e ouvir os relatos de empresas brasileiras
sobre o tema.
O mundo ainda vivia a ressaca do acidente de
Bophal, na India (https://pt.wikipedia.org/wiki/Desastre_de_Bhopal)
e havia um medo crescente de que os ganhos de escala das empresas, somados com
o manuseio de insumos e produtos de risco colocasse a vida das pessoas em
risco. Como ter certeza que as populações que viviam perto das empresas não
corriam riscos? Por lado, especialmente as empresas químicas e petroquímicas estivam
pensando nisso, como garantir que sua atuação não causaria a morte ou danos nas
regiões em que operavam? Por outro, os governos não se mexiam.
Em 1984 as empresas brasileiras organizadas na
Associação Brasileira de Indústrias Químicas (ABIQUIM) trazem para o Brasil o
Programa de Atuação Responsável criado no Canadá para melhorar a imagem das indústrias
químicas por meio de atuação preventiva nas áreas de saúde, segurança e meio
ambiente. A ideia era de que as empresas não precisam esperar que os governos
atuassem e poderiam se autorregular mesmo antes da existência de legislação
especifica. Muitas empresas brasileiras começaram, por livre iniciativa, a
aderir ao programa.
Essas iniciativas deram origem a estudos que
levaram à criação de normas industriais, consolidadas nas normas ISO. Surgem
várias certificações, como a ISO 14.000, que trata de meio ambiente, e a ISO
55000, que trata do cuidado com as instalações e outros. As empresas químicas e
petroquímicas brasileiras aderiram a implantaram essas normas, que criou um
circulo virtuoso de aprimoramento que levou a redução de desperdícios e a
inovações em processos industriais que retornaram na forma de redução de
custos.
Mas imagens como a de Cubatão (em que o ar era irrespirável
naquela época - https://www.bbc.com/portuguese/brasil-39204054
) e do Rio Tietê eram assustadoras.
A questão da chuva acida no Japão
causada pela poluição na China ( https://www.sciencedirect.com/science/article/pii/S0166046206000809
) , com a morte de arvores e danos para a agricultura, sinalizavam a
possibilidade de conflitos internacionais.
As empresas apontam para vários problemas de
ação coletiva derivadas disso. Se uma empresa poluía rio acima, a outra tinha
custos quase impagáveis para limpar e ter acesso à água rio abaixo. Se uma
empresa não tratava seus dejetos e afluentes, os problemas de saúde publica
decorrentes demandavam aumento de impostos para cuidar das consequências. Funcionários
doentes em Cubatão tinham maior absenteísmo. O custo dos planos de saúde para
os dependentes ia ficando cada vez mais caro. Fora os óbvios problemas éticos.
Conflitos com essas questões prometiam piorar o
ambiente de negócios. As empresas e
associações industriais temiam não só pela desorganização que isso geraria, mas
pelos óbvios custos não estimados de correção. Como planejar os investimentos
no futuro? Como colocar bilhões de dólares em indústrias químicas e petroquímicas
com esse tipo de risco? A prosperidade estava em risco.
Um órgão pouco conhecido no Brasil: A UNU.
Universidade das Nações Unidas, que fica em Tóquio, coordenava estudos sobre
esses temas. Ela é uma meta universidade que coordena linhas de pesquisa em
universidades de todo o mundo para gerar bases cientificas para decisões
informadas. Na época que eu estava no Japão e na época do acordo de Kyoto, o
reitor da UNU era o professor Gurgulino (https://pt.wikipedia.org/wiki/Heitor_Gurgulino_de_Souza)
– mostrando a liderança no Brasil nas pesquisas que levaram às recomendações
atuais.
A questão era: como valorar o meio ambiente
para poder precificar os danos e portanto dar segurança aos investimentos?
Como garantir que aqueles que não fazem a sua
parte não destruam tudo que os outros estão fazendo?
Surgem os estudos sobre bens não rivais e não
excludentes: como ar limpo e segurança pública, que por sua natureza não podem
ser delegados ao mercado. Segurança e ar limpo tem a seguinte característica:
quanto mais tiver melhor para todos. Mas o individuo tem incentivo para sujar.
É mais barato e mais lucrativo no curto prazo. Como resolver esse dilema? As empresas
lideravam os debates nessa direção. O mundo acadêmico e a UNU vieram depois. O
Pacto Global da ONU é o produto desse longo processo.
Isso só se agravou com outros acidentes. No
Brasil houve grande acidentes com a Petrobras. O adernamento da P-36, o
derramamento de óleo na Baia de Guanabara e no rio Paraná. Enormes esforços de
ganhos de produtividade eram perdidos nas multas e indenizações pelos danos
causados. O acidente da British Petroleum no Golfo do México gera gigantescos
prejuízos para seus acionistas e para todos em volta.
A dissociação entre propriedade e gestão,
existente nas grandes multinacionais, vinha criando riscos impensáveis para os
acionistas. O problema da assimetria de interesses entre agente (executivo) e
principal (acionista) começa a preocupar especialistas e pesquisadores. Para ganhar
mais bônus de curto prazo, o executivo poderia decidir investir menos em
manutenção e meio ambiente – gerando riscos e prejuízos enormes para os
acionistas, que não estavam dentro da empresa para ver e opinar. Como criar
modelos de governança empresarial que reduzam esse problema? Ou ainda: como
comprovar, financeiramente, para todos os acionistas, a relevância de investir
em prevenção?
Freeman propõe uma estratégia de responsabilidade
social corporativa para endereçar essas questões (https://en.wikipedia.org/wiki/R._Edward_Freeman).
Friedman (https://en.wikipedia.org/wiki/Friedman_doctrine)
critica, afirmando que a responsabilidade da empresa era retornar para o
acionista. Uma grande parte das empresas aderem a primeira proposta. Algumas
advogam pela segunda proposta, mas não conseguem convencer os investidores do
mercado de capitais, pois não gerenciam os riscos ambientais e especialmente os
fundos de pensão, interessados em rentabilidade de longo prazo, não bancam os
riscos.
Do mesmo modo a questão de gênero e diversidade.
É do interesse dos acionistas de empresas que competem em mercados inovadores
que essas tenham o maior número de talentos nas suas organizações. A IBM tem o
programa de diversidade mais antigo do mundo: desde 1910. E com isso traz os
melhores talentos das melhores universidades para seus quadros. Todos os
estudos mostram que diversidade tem forte correlação com inovação. No Brasil,
as mulheres são 59,9% dos egressos de cursos superiores (fonte: INEP), 54,20%
dos mestres e 52,10% dos doutores. São 45.5% dos docentes de nível superior,
mas responsáveis por 49% dos artigos científicos escritos no Brasil em 2017. Mas
na dinâmica de inovação brasileira não há mulheres. Hoje se faz seleção
adversa: todos competem por homens brancos. Logo, há menos talentos nesse grupo
disponíveis para contratação. Então para evitar mulheres, contratam-se homens
com pior formação e desempenho. Para que? Para evitar a licença maternidade. Mas
quem faz isso? Aquele que seleciona para a sua equipe, focado nas tarefas de
curto prazo e sem visão do impacto disso na estratégia da empresa. A IBM
resolveu isso colocando como item de remuneração variável para seus executivos
estar no topo do ranking “Melhores empresas para as mães trabalharem”. O
resultado é expressivo em termos de inovação. Logo, não são as “empresas” que
discriminam. São pessoas dentro delas. De forma contraria aos interesses dos
acionistas. Mas esses não estão na gestão. Então são necessários programas e
mecanismos para auferir se os processos são meritocráticos e não excluem as
mães. Mas o fato é que excluem. As empresas estão implantando programas de
diversidade e indicadores de diversidade por essa razão. Os acionistas querem
ter certeza de que os executivos estão fazendo a coisa certa para produzir
valor sustentável no médio e longo prazos. Mas no debate politico muitos acham
que essa é uma questão da esquerda. Há muita dificuldade para pensar em jogo
ganha-ganha no Brasil. Porque, para isso, é preciso sair das redes sociais e parar
para tentar entender o que está acontecendo de fato.....
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