Sobre a informação, a desinformação e os riscos para a democracia
Na
teoria, a democracia é um conjunto de regras que garante que a gestão pública é
feita de acordo com a vontade da maioria. É um mecanismo de fragmentação do
poder (nas três esferas: legislativo, executivo e judiciário) que garante os
direitos dos indivíduos frente à concentração de poder necessária ao
funcionamento do Estado e a garantia da liberdade. É contra intuitivo achar que
a liberdade se relaciona positivamente com o Estado. Mas basta lembrar da
sociedade medieval, antes da unificação dos territórios em Estados nacionais:
havia o monopólio da força pelos senhores feudais mais fortes e todos viviam
sob domínio das suas regras. Não havia mecanismos de garantia de contratos, não
havia justiça e não havia polícia para a qual ligar se alguém entrasse violentamente
na sua casa e impusesse a sua vontade por meio da força. O filme de Mel Gibson, Coração Valente, é um
bom exemplo do que é isso. O filme “O Nome da Rosa”, baseado no romance de
Umberto Eco, também, pois mostra o que acontece quando uma instituição (a
igreja daquele tempo) dá as regras sobre o que pode ser lido, dito ou pensado.
Foram séculos de evolução até chegar em um arranjo em que os direitos dos
indivíduos pudessem estar garantidos. A concentração do direito ao uso da força
pelo Estado e a regulação do seu uso por meio da lei discutida democraticamente
foi o que acabou com esses abusos. A liberdade de ir e vir, especialmente das
mulheres, fisicamente mais fracas, dependeu de um arcabouço legal capaz de
condenar à prisão quem, no uso da sua liberdade e dos seus direitos, viola a
liberdade e o direito dos outros.
A
defesa dessa liberdade dos indivíduos: contra a opressão direta por outro ser
humano e a liberdade de escolha (entre permanecer ou não em uma relação
contratual e liberdade de empreender) gerou um enriquecimento sem precedentes
nas sociedades que conseguiram se organizar para garanti-la. Há aqui uma
questão chave para nós, hoje, no Brasil: garantir que o Estado seja essa
organização criada pela sociedade para garantir direitos, contratos e a
liberdade. Um Estado capaz de garantir o direito à vida (ninguém pode matar
ninguém por força da sua vontade), o direito à liberdade (só o Estado pode
condenar, punir e emprisionar) e o direito à propriedade é fundamental para a
produção de riquezas e a viabilização da justiça. O contrário disso seria a
guerra de todos contra todos, em que indivíduos gastam suas vidas lutando para
não ser atacado naquilo que em sociedade chamamos de direitos fundamentais, ou
a perda da liberdade causado por uma organização estatal que não garante a
liberdade e os direitos, mas usa a concentração de poder para impor sobre a
sociedade um projeto que não representa o melhor interesse da maioria. De modo geral as pessoas concordam com essa
ideia de liberdade e de que o Estado deveria garanti-la…. A não ser quando
aqueles que são contrários a ela embaralham a comunicação….
Durante
os últimos anos vivemos sob o governo de um partido que, no discurso público
defendia aquilo que acreditava que a população queria ouvir, mas pelas costas
da sociedade criava um projeto de aumento do seu poder para implantar um regime
que, se explicitassem, se falassem as claras, se botassem em discussão, a
sociedade não aprovaria. As campanhas foram montadas sobre mentiras. As
estratégias das agências de publicidade que desenvolveram o marketing político
no Brasil estão baseadas não apenas em argumentos falsos, mas em estratagemas e
planos táticos desenvolvidos para gerar confusão e desinformação. Mente-se, não
apenas por falta de caráter, mas como parte de um projeto de poder. Enrola-se a
comunicação para que a maioria não consiga, no caos de argumentos desconexos,
articular um discurso de orientação por valores que seja a síntese daquilo que
deseja ver na prática política. No meio do caos, os indivíduos se sentem incapazes
de saber quem é bom e quem é ruim, o que é possível e o que não é, e acabam por
ser levados por simpatias ou pela emoção.
Esse é o começo do fim da democracia e de séculos de esforços por
garantir que as liberdades individuais e a racionalidade na escolha
prevalecessem no cenário político. As campanhas baseadas em simpatias e emoção
só beneficiam aqueles que, se apertados no terreno duro da racionalidade e
possibilidades concretas, perdem espaço para suas agendas ocultas e seus
acordos mirabolantes.
É
por isso que mantemos a ancora no pragmatismo, na orientação por valores e no
discurso simples de quem lida com dados, fatos, possibilidades e restrições
reais. Contra todas as formas de engano, confusão e conflito, que são
estratégias de poder que destroem os direitos individuais e as liberdades,
voltamos sempre aos dados, fatos e valores. Essa é a estratégia de resistência
necessária aos cidadãos comuns que dizem não às formas espúrias de fazer
política. Não nos interessa ganhar com
mentiras. Não nos interessa a confusão. Não nos interessa uma campanha em que
oponentes pegam frases soltas, fragmentos de informação, e nos atacam. Essa é a
forma de fazer política dos desonestos e das suas vítimas, aqueles que, sem
domínio das próprias emoções, saem atirando argumentos como loucos no meio dos
debates sem sentido buscando desesperadamente acreditar que com isso conseguem fazer
a diferença no meio da gritaria. Estamos do lado dos que fazem o duro exercício
da ética e da razão. Serão necessários: resiliência, autocontrole, foco e
paciência na dura tarefa de fazer uma campanha limpa. Vão nos atacar de todas
as formas. Essa é a tática dos nossos oponentes. Nos manteremos firmes na busca
por valores e na racionalidade ancorada em dados, fatos, possibilidades e restrições. Como cidadãos na política prometemos lutar
contra o caos produzido pelas táticas de desinformação, rotulação, acusações
soltas e decisões precipitadas e parciais. Faremos isso porque temos certeza de
que essa é a única forma de representar cidadãos como nós, comprometidos com a
qualidade da escolha na política, com representatividade democrática, com a
concretude das promessas, dentro de uma sociedade de indivíduos capazes de
exercer a liberdade com responsabilidade.
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